"Ao passear por entre os homens do meu povo, no delta da tarde, quando tudo se desfaz, atinei com eles, de vestes amarfanhadas, na soleira das humildes quitandas, repousando de uma atividade de abelhas. Interessava-me menos por eles do que pela perfeição do favo de mel em que todos tinham trabalhado ao longo do dia. E pus-me a meditar diante de um deles, que era cego e tinha além disso perdido uma perna. Todo ele rangia, como um moinho velho, cada vez que se mexia, e respondia lentamente, porque era de idade avançada e começava a perder a clareza na articulação das palavras, mas tornava-se cada vez mais luminoso e compreensivo no objeto mesmo da sua troca. Porque, com as mãos trêmulas amealhava ainda o seu trabalho, que se ia tornando elixir cada vez mais sutil. E ele, evadindo-se tão prodigiosamente da sua velha carne encarquilhada, tornava-se cada vez mais feliz, cada vez mais inacessível. Cada vez mais imorredouro. Ao morrer, levava, sem dar conta disso, as mãos cheias de estrelas..."
Escrito por Saint-Exupéry (Cidadela)